O Orçamento Participativo em Natal: falta de recursos ou de vontade política?

Autores

  • Lindijane Almeida UFRN
  • Glenda Ferreira
  • TEREZINHA BARROS
  • RAQUEL SILVEIRA

Palavras-chave:

Orçamento Participativo, Gestão Democrática, Municípios, Natal

Resumo

RESUMO SIMPLES

A pesquisa proposta tem como objeto de estudo Orçamento Participativo (OP) no município do Natal/RN e sua relação com a gestão democrática das cidades e a participação social, adotando-se a perspectiva de análise focada na dimensão fiscal-financeira. Considera-se o OP um instrumento de participação social e de gestão democrática, porém, via de regra, os estudos sobre o tema enfocam apenas basicamente na dimensão político-relacional. Na presente pesquisa, tem-se como objetivo verificar as condições fiscais-financeiras do município para a implementação do OP, como meio para a análise em torno de uma possível ausência de vontade política para a sua realização. Trata-se de uma pesquisa de natureza quali-quantitativa. Para tanto, além da revisão bibliográfica, foram realizadas entrevistas semiestruturadas, pesquisa documental nas Leis Orçamentárias Anuais (LOA´s) do período de 2006 a 2022 e a pesquisa eletrônica no portal do Sistema de Informações Contábeis e Fiscais do Setor Público Brasileiro (Siconfi).

 

RESUMO EXPANDIDO

A proposta de artigo se insere no debate teórico sobre gestão democrática das cidades e participação social, focalizando no exame do Orçamento Participativo (OP) no município do Natal/RN. Nesse contexto, tem-se como objetivo verificar as condições fiscais-financeiras do município para a implementação do OP.

A revisão da literatura derivada da pesquisa bibliográfica ilumina o desenvolvimento deste artigo em duas perspectivas que se interrelacionam, quais sejam: o (i) debate teórico-analítico sobre participação social e gestão democrática das cidades; e (ii) o resgate do debate acerca do processo de implementação do Orçamento Participativo no município do Natal/RN.

O OP esteve presente de forma latente em várias cidades brasileiras entre 2000 e 2004, quando, em 2008, foi detectado um movimento de declínio em sua adoção no país (BEZERRA, 2017). No entanto, essa experiência tornou-se um instrumento de gestão pública capaz de assegurar a participação social na discussão e deliberação de políticas públicas. Primeiramente, possibilitou uma inovação no âmbito da participação na gestão pública; em segundo lugar, houve uma inversão de prioridades nos investimentos públicos; e, em terceiro, proporcionou o protagonismo de setores sociais historicamente excluídos do desenvolvimento urbano. Além disso, promoveu o fomento à transparência, o controle social do orçamento e a legitimação da administração municipal (FEDOZZI, 2001; WAMPLER, 2003).

Para Wampler (2003) a experiência pode ser conceituado como: a) uma força inicial de transformação social, b) uma instituição democrática e c) uma instituição de elaboração de políticas públicas. E sua percepção, está relacionada a uma “escola”, que permite compreender o que os governos fazem, o que não podem fazer e como os cidadão devem se comportar diante de seus direitos e deveres. É uma “instituição que tem o potencial de transformar a vida dos cidadãos comuns na medida em que abre esferas, previamente restritas, de tomada de decisão governamental.” (WAMPLER, 2003, p. 64).

Apesar da maioria das experiências destinar poucos recursos para deliberações, o OP foi uma importante prática de inclusão política do cidadão no processo de produção de políticas públicas, competindo com outras agências estatais pela distribuição de autoridade, poder e recursos(PERES, 2020). Uma vez que “desqualificam o ‘realismo elitista’ como concepção única e possível de democracia”. (LÜCHMANN, 2002, p.197)

Considerando o exposto, a principal contribuição do presente estudo é a de possibilitar a ampliar o campo de análise sobre a relação entre orçamento participativo e a dimensão fiscal-financeira da gestão pública na escala municipal. O OP é  um importante instrumento de participação social e de gestão democrática, porém, via de regra, os principais estudos sobre o tema estão focalizados basicamente na dimensão político-relacional, na qual se considera um olhar mais acurado para a dinâmica interativa entre Estado e sociedade, destacando mais os atores e suas práticas.

A análise em torno da dimensão fiscal-financeira considera que, em uma federação bastante assimétrica como a brasileira, questões relacionadas à autonomia e interdependência, em particular relativa à dimensão financeira, precisam ser olhadas com muita atenção. Na prática, pode-se dizer que tal dimensão “se constitui não apenas pela disponibilização e utilização de recursos financeiros por governos municipais, como também por incentivos e execuções orçamentárias e financeiras por parte do governo federal” (FERREIRA, LIMA-SILVA e RAMELLI, 2021, p. 105).

Nesse contexto, pensar recursos destinados para o Orçamento Participativo implica em compreender, também, as relações intergovernamentais no âmbito do federalismo brasileiro. Com relação a isso, supõe-se ser evidente que a dimensão fiscal-financeira ocupa lugar de destaque, em particular porque na história da nossa federação o sistema de partilha de recursos continua servindo de amálgama para equacionar eventuais situações conflituosas e até mesmo cooperativas entre os entes federados.

Logo, lançar luz sobre a dimensão fiscal-financeira é mais do que examinar séries históricas relacionadas à receitas e despesas, e as derivações de ambas, por exemplo. É, também, refletir acerca dos efeitos dessas relações intergovernamentais sobre a autonomia financeira dos governos subnacionais (estados e municípios), e os desdobramentos disso quando se pensa a relação entre Estado e Sociedade, por meio de um instrumento de gestão participativa como é o caso do Orçamento Participativo.

Com relação à metodologia, trata-se de uma pesquisa pesquisa de natureza qualitativa e quantitativa. Para a sua execução  foram adotadas as seguintes técnicas de coleta de dados: revisão bibliográfica, realização de entrevistas semiestruturadas, de pesquisa documental e de pesquisa eletrônica. Essa foi realizada no portal do Sistema de Informações Contábeis e Fiscais do Setor Público Brasileiro (Siconfi), no Tribunal de Contas do RN e no Portal da Transparência da Prefeitura do Natal. Na pesquisa documental foram coletadas informações das Leis Orçamentárias (LOA´s) do período de 2006 a 2022, o que representa o período em que as observações estão disponíveis para consulta no site da Secretaria Municipal de Planejamento da Prefeitura do Natal.  Considerando os dados extraídos da pesquisa eletrônica e documental, fez-se um estudo de caso único com estatística descritiva e exploratória.

A pesquisa documental, por sua vez, retornou dados importantes para a compreensão da evolução do orçamento participativo no município do Natal/RN na sua relação com os instrumentos do ciclo orçamentário.  Nesse sentido, foram extraídos dados sobre função orçamentária, programa, ação, órgão, tipo de programa e previsão orçamentária. Também foram coletados dados do Portal do Tribunal de Contas do Rio Grande do Norte, no qual foi possível obter dados disponíveis apenas para o período de 2017 a 2022 sobre receitas (prevista e arrecadada), despesa (prevista, empenhada, liquidada e paga) e percentuais relativos à educação, saúde, despesas com pessoal e repasses para o legislativo, conforme preconizam os marcos regulatórios.

O artigo está estruturado em quatro seções, além da introdução e das considerações finais. Na primeira seção, são feitas as considerações metodológicas. Na segunda, é realizado um breve resgate do debate teórico sobre participação social, orçamento participativo e gestão democrática das cidades. Na terceira, discutem-se as características e a evolução do Orçamento Participativo em Natal. A quarta seção examina a relação entre o processo de implementação do OP e a dimensão fiscal-financeira do município de Natal.

 

 

REFERÊNCIAS

 

BEZERRA, Carla de Paiva.Por que o Orçamento Participativo entrou em declínio no Brasil? Mudanças na legislação fiscal e seu impacto sobre a estratégia partidária. In: Anais.. 41o ENCONTRO ANUAL DA ANPOCS, Caxambu-MG, Brasil, 2017.

FEDOZZI, Luciano. Práticas inovadoras de gestão urbana: o paradigma participativo. Revista Paranaense para o Desenvolvimento. Curitiba, n. 100, p. 93-107, jan./jun. 2001.

FERREIRA, Glenda D.; LIMA-SILVA, Fernanda; RAMELLI, Felipe. Dimensão fiannceira da capacidade estatal e gestão municipal. uma análise da política de habitação de João Pessoa no período recente. In: Revista Brasileira de Políticas Públicas e Internacionais (RPPI).  João Pessoa/PB. v. 6;n º3, 2021. p 102-126.

LÜCHMANN, L. H. H. Possibilidades e limites da democracia deliberativa: a experiência do orçamento participativo de Porto Alegre. Campinas, 2002. Tese (Doutorado em Ciências Sociais) - Universidade Estadual de Campinas, 2002.Disponível: <http://www.democraciaparticipativa.org/files/LigiaLuchmann.pdf.> Acesso em: 07.maio. 2010.

PERES, Ursula Dias. Dificuldades institucionais e econômicas para o Orçamento Participativo em municípios brasileiros. Caderno CRH, Salvador v.33, p.01-20, 2020.

WAMPLER, Brian. O Orçamento Participativo: uma explicação para as amplas variações nos resultados. In: AVRITZER, Leonardo; NAVARRO, Zander. (orgs.). A inovação democrática no Brasil. São Paulo: Cortez, 2003.

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Publicado

2024-01-04

Edição

Seção

ST 11 - Participação Social e Ação Pública: perspectivas para o fortalecimento da democracia e da gestão pública