Orçamento Público: espelho da não prioridade de crianças e adolescentes nas políticas do governo federal

Autores

  • Thallita de Oliveira Silva Universidade de Brasília

Palavras-chave:

Orçamento Público; Crianças e Adolescentes; Prioridade Absoluta

Resumo

Resumo simples

O orçamento público é uma ferramenta fundamental de análise das prioridades de governos no que tange à realização de políticas públicas. As recentes análises do orçamento federal direcionado às crianças e adolescentes (Inesc, 2023) e dos indicadores sociais relacionados a este público (Unicef, 2023) demonstram que as infâncias e adolescências têm sido sistematicamente abandonadas nos últimos anos. Esta pesquisa objetiva mostrar o funcionamento do orçamento público federal voltado para crianças e adolescentes, considerando o Plano Plurianual e a Lei Orçamentária Anual, nos últimos 12 anos a partir da metodologia de análise documental e utilizando como base de dados a plataforma do Senado Siga Brasil. A proposta foi refletir sobre quais foram as políticas públicas priorizadas e como isso afetou a garantia dos direitos humanos de meninas e meninos no país correlacionando com os indicadores sociais de empobrecimento, trabalho infantil e outras violências. Os resultados da análise mostram o desmantelamento das políticas de crianças e adolescentes, principalmente a partir de 2017, primeiro ano de vigência da emenda constitucional do teto de gastos; desfinanciamento ao longo dos anos; e foco em políticas de proteção e defesa em detrimento das políticas de promoção de direitos e prevenção de violações.

 

 

Resumo Expandido

O orçamento público é uma ferramenta fundamental de análise das prioridades de governos no que tange à realização de políticas públicas. Nos anos de crise decorrentes da pandemia de Covid-19, o debate orçamentário se fez mais presente na população como um todo quando da necessidade de se investir mais na política de saúde e em políticas de transferência de renda. Portanto, o acompanhamento sistêmico da execução financeira do governo contribui para analisar a evolução total de gastos despendidos com grupos populacionais específicos como a infância e adolescência (Filho, 2011) e possibilita intervenções da sociedade em prol de recursos para o que é de seu interesse. As recentes análises do orçamento federal direcionado às crianças e adolescentes (Inesc, 2023) e dos indicadores sociais relacionados a este público (Unicef, 2023) demonstram que as infâncias e adolescências têm sido sistematicamente abandonadas nos últimos anos e com maior força no período pandêmico. Diante disto, este artigo tem como objetivo analisar o orçamento público federal voltado para crianças e adolescentes, considerando os Planos Plurianuais e as Leis Orçamentárias Anuais, nos últimos 12 anos a partir da metodologia de análise documental e utilizando como base de dados a plataforma Siga Brasil do Senado Federal. O intuito da pesquisa também é: 1) contribuir para reflexões mais abrangentes sobre o tema, mostrando uma linha histórica maior da evolução dos gastos possibilitando comparações no tempo e nas gestões do executivo federal; 2) refletir sobre quais foram as políticas públicas priorizadas e como isso afetou a garantia dos direitos humanos de meninas e meninos no país correlacionando com os indicadores sociais de empobrecimento, trabalho infantil e outras violências. Os resultados da análise mostram o desmantelamento das políticas de crianças e adolescentes, principalmente a partir de 2017, primeiro ano de vigência da emenda constitucional 95, referente ao teto de gastos; desfinanciamento ao longo dos anos; demandas não atendidas em completude, seja pela não execução do orçamento autorizado, seja pelo investimento em políticas de governo e não de estado; foco em políticas de proteção e defesa em detrimento das políticas de promoção de direitos e prevenção de violações, como é o caso das violências urbanas, sexuais e trabalho infantil. Esses resultados não advêm da falta de recursos, mas de escolhas políticas (Jambersi; Oliveira, 2020) que são espelhadas de forma eficaz pelo orçamento público. Analisar o orçamento direcionado especificamente para crianças e adolescentes ainda é um desafio no que diz respeito à transparência das informações. Os documentos e bases de dados institucionais não disponibilizam todas as informações necessárias para uma avaliação mais qualificada da execução das políticas governamentais e os dados disponíveis são pouco detalhados no que tange à população ou região atingida. Mas ainda assim é possível filtrar dentro de algumas políticas ações específicas de gastos com crianças e adolescentes e o estudo do orçamento nos mostrou que o princípio de prioridade absoluta está longe de ser alcançado. Essa análise converge com pesquisas anteriores sobre a execução do orçamento voltado para crianças e adolescentes (Filho, 2011; Jambersi e Oliveira, 2020; Santos et al, 2017). Há poucos programas e ações direcionadas especificamente para este público, pois muitas vezes as ações estão desmembradas em rubricas mais abrangentes, o que impossibilita o monitoramento. E as ações existentes têm recursos insuficientes e não são gastos na totalidade do que foi autorizado. Essa gestão ou não gestão do orçamento para a área tem tido efeito direto na vida de meninas e meninos do Brasil. Milhões de crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil, de fome, milhares em situação de violência sexual e outras violências, em situação de rua e fora da escola. É necessário que se dispute o orçamento público para a garantia dos direitos de meninas e meninas, considerando as especificidades regionais, de gênero, de raça e de classe e que as próprias crianças e adolescentes se envolvam ativamente nesta construção. O orçamento público deve ser um debate de toda a sociedade e não somente de especialistas, porque é um instrumento majoritariamente político e não técnico. Portanto, vai ter impacto no cotidiano de cada pessoa.

 

REFERÊNCIAS:

AMBERSI, K. S; OLIVEIRA, A. G. Orçamento para os direitos das crianças e adolescentes em Curitiba: plano e execução. Revista Brasileira de Políticas Públicas, Brasília, v. 10, n. 1 p.223-243, 2020 Disponível em: <http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/documentacao_e_divulgacao/doc_biblioteca/bibli_servicos_produtos/bibli_informativo/bibli_inf_2006/Orcamento-direitos-criancas-adolescentes-em-Curitiba.pdf.>

INESC. Depois do Desmonte – Balanço do Orçamento Geral da União 2022. Brasília, 2023. Disponível em: <https://www.inesc.org.br/depoisdodesmonte/>.

SADECK FILHO, Francisco José. O orçamento público federal e a garantia de prioridade absoluta de crianças e adolescentes nas políticas públicas. 2011. 190 f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2011. Disponível em: <http://www.bdtd.uerj.br/handle/1/14875>

SANTOS, F. R., MOREIRA, A. R. C. J.; Gonçalves, A. O.; ISHIKAWA, V. R. (2017). O orçamento-programa e a execução das políticas públicas. Revista Do Serviço Público, 68(1), 191 - 212. Disponível em: <https://doi.org/10.21874/rsp.v68i1.1038>.

UNICEF. As Múltiplas Dimensões da Pobreza na Infância e na Adolescência no Brasil. Brasil, 2023. Disponível em: <https://www.unicef.org/brazil/relatorios/as-multiplas-dimensoes-da-pobreza-na-infancia-e-na-adolescencia-no-brasil> .

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Publicado

2024-01-04

Edição

Seção

ST 14 - Agenda-setting e Formulação de Políticas Públicas