Construção da avaliação da participação nos Planos Diretores dos Aglomerados Urbanos de Franca e São José dos Campos
Palavras-chave:
Avaliação, Participação, Planos Diretores, Direito à cidade, DemocraciaResumo
Resumo simples:
Tendo como referência a perspectiva do direito à cidade, que prevê a garantia dos direitos espaciais e a recriação das relações de poder, pela ação política e controle democrático da lógica participativa, o projeto referência desta comunicação, ainda em desenvolvimento, como parceria entre três núcleos de pesquisa, tem como objetivo avaliar a participação nos contextos de implementação e revisão dos Planos Diretores de 21 municípios vinculados às aglomerações urbanas de duas regiões do país, dando destaque a este trabalho com municípios de pequeno e médio porte. O propósito específico da comunicação, em consonância com a proposta desta Sessão Temática, é descrever o percurso teórico-metodológico de construção do modelo de avaliação de participação de elaboração/revisão de planos diretores, contribuindo com o debate acerca da possibilidade avaliativa da participação nestes casos, seus desafios e potencialidades, considerados seus múltiplos atores sociais e institucionais enredados neste processo, desde uma perspectiva de democracia efetivamente participativa.
Resumo expandido :
A promulgação do Estatuto da Cidade, em 2001, fixou diretrizes e previu diversos instrumentos de regulamentação urbanística para o cumprimento da função social da propriedade e da cidade, exigiu a elaboração do Plano Diretor para municípios com mais de 20 mil habitantes, bem como delimitou o seu conteúdo mínimo e incluiu a previsão da participação da sociedade civil na direção, planejamento, controle e avaliação das políticas públicas nestes processos. Tais direitos foram conquistados a partir dos movimentos sociais pelos direitos urbanos, que tinham como elemento central da Política Urbana a gestão democrática da cidade, com destaque para a participação que, desde então, tem sido experimentada em diversas cidades brasileiras em algum grau.
Contudo, mesmo com a inserção do tema cada vez mais reforçado e com o reconhecimento de sua potencialidade (BUCCI 2010; FERNANDES 2007), a experiência prática e as pesquisas acerca de tais processos revelam uma série de limites (ROLNIK 2009; MARICATO, 2008), evidenciando a necessidade de se estabelecer um processo participativo que dê conta das particularidades de cada processo.
Tendo como referência a perspectiva do direito à cidade, que prevê a garantia dos direitos espaciais e a recriação das relações de poder, pela ação política e controle democrático da lógica participativa, o projeto referência desta comunicação tem como objetivo avaliar a participação nos contextos de implementação e revisão dos Planos Diretores de 21 municípios vinculados às aglomerações urbanas de duas regiões do país, colaborando com a literatura acerca da avaliação dos processos participativos. Também se faz importante destacar nele o interesse em descrever e refletir sobre estes processos em municípios de pequeno e médio porte, em geral, pouco explorados nestes tipos de estudos que maximizam olhares sobre os grandes centros e capitais.
A principal questão que se apresenta para a pesquisa em tela é: como avaliar empiricamente a participação nos processos de elaboração e/ou revisão dos planos diretores? Este é o desafio colocado para o Grupo de Pesquisa, à frente de seu desenvolvimento, composto por docentes e discentes de Doutorado, Mestrado e Graduação em Ciência Política, Direito, Sociologia Urbana e Planejamento Urbano e Regional, em um diálogo interdisciplinar, o qual pretende-se expandir para a discussão junto ao GT 16 “Avaliação de Políticas Públicas” no V Encontro Nacional de Ensino e Pesquisa do Campo de Públicas.
Nesta pesquisa, tendo estabelecido o debate acerca do direito da cidade e a relevância do tema da participação como ponto de partida inicial da construção do referencial teórico-metodológico da pesquisa, o passo seguinte estabeleceu-se como sendo o da necessidade de definição do conceito de participação. Tal perspectiva constitui-se como parte integrante de uma visão mais ampla acerca da própria democracia. Neste sentido, os defensores de uma perspectiva de democracia participativa, a qual se vincula esta pesquisa, apresentam suas teses como um contraponto à perspectiva minimalista de democracia representativa. Nela, a participação assume papel central – uma dimensão pedagógica na construção de uma democracia mais ampla. Uma dimensão no sentido de desenvolver capacidades de modo que os indivíduos privados se tornem cidadãos e os seus interesses se refaçam em direção ao bem-comum. Isso não significa a negação da lógica representativa como substrato relevante e constitutivo da democracia.
Desta perspectiva de democracia em tela, depreende-se a definição de participação utilizada na pesquisa que se refere a um acordo entre os indivíduos com sentimentos comuns de reconhecimento e consideração do outro. Mas, para além de uma perspectiva contrária à lógica competitiva, opta-se por uma definição que estabelece uma clara diferença entre participação meramente formal e a participação executada na prática, com incidência comprovada. Nos termos do clássico trabalho de Arnstein (2002), “[...] existe uma diferença fundamental entre passar pelo ritual vazio da participação e dispor de poder real para influenciar os resultados do processo” (p. 2).
A hipótese aventada nesta pesquisa é a de que os processos de elaboração e/ou revisão de Planos Diretores, com melhor qualidade no que concerne à participação, tendem a ser mais transparentes e a publicizar mais evidências da participação e do processo como um todo, sempre em que, de fato, esta participação efetivamente for garantida.
Assim, conhecer este processo com evidências empíricas referidas à lógica de cada local, vinculadas ao contexto da própria localidade, faz-se fundamental para podermos analisar as potencialidades e limites do instrumento do Plano Diretor, dentro do Estatuto da Cidade.
Estas evidências empíricas já estão sendo coletadas a partir do levantamento de documentos públicos vinculados à elaboração dos Planos Diretores nos municípios de interesse e complementadas por entrevistas qualitativas com os principais atores participantes dos processos de elaboração e revisão dos planos diretores que possam gerar informações mais detalhadas do processo. Ambos, documentos e entrevistas, serão analisados a partir do modelo de avaliação que está sendo construído e será tema central desta comunicação.
A previsão das instâncias de participação na “nova ordem jurídico-urbanística” defendida por Fernandes (2007) representou a consolidação da integração entre os representantes eleitos e a população em geral. Neste sentido, o Estatuto da Cidade e as normas construídas ao longo dos anos pelo Conselho das Cidades constituem-se como indicadores que guiarão a análise. Mas, outros critérios e indicadores também serão abordados no trabalho para a construção do modelo avaliativo, sobretudo aqueles apontados por Parés e Castella (2009) para a avaliação dos processos participativos, a saber: o método participativo, os participantes, o processo participativo pela sua coordenação, sua temática e seus resultados. Cada critério, com indicadores próprios a serem considerados, serão descritos com a inclusão das metodologias de acordo com cada caso.
O objetivo da presente proposta é consoante ao objetivo desta Sessão Temática, na medida em que, coloca em debate não só a perspectiva teórica de avaliação de políticas públicas participativas, mas também as questões metodológicas da experiência em andamento de avaliação da participação em Planos Diretores Municipais, considerados seus múltiplos atores sociais e institucionais enredados neste processo. Dessa forma, alcança-se o objetivo da ST de reflexão e debate a partir de avaliações que afirmam os valores democráticos e a participação, articulando interfaces entre a sociedade e a gestão pública no recente contexto político brasileiro.
REFERÊNCIAS
ARNSTEIN, Sherry R. Uma escada da participação cidadã. Revista da Associação Brasileira para o Fortalecimento da Participação – PARTICIPE, Porto Alegre/Santa Cruz do Sul, v. 2, n. 2, p. 4-13, jan. 2002.
BUCCI, Maria Paula Dallari. Gestão democrática da cidade. In: DALLARI, Adilson Abreu;
FERRAZ, Sérgio (org.). Estatuto da Cidade: comentários à lei federal 10.257/2001. São
Paulo: Malheiros, 2010. p. 335-354.
FERNANDES, Edésio. Constructing the “Right to the City” in Brazil. Social & Legal Studies,
Los Angeles, London, New Delhi and Singapore, v. 16, n. 2, p. 201-219, 2007.
MARICATO. Ermínia; SANTOS JÚNIOR. Orlando Alves do. Construindo a política urbana: participação democrática e o direito à cidade. In: Luiz Cesar de Queiroz Ribeiro; Orlando dos Santos Junior (org.). As metrópoles e a questão social brasileira. 1 ed. Rio de Janeiro: Editora Revan; Fase, 2007, v. 1, p. 165-195.
PARÉS, Marc; CASTELA, Carola. Una propuesta de criterios de calidad democrática para evaluar los procesos participativos. In: PARÉS, Marc (org.). Participación y calidad democrática: evaluando las nuevas formas de democracia participativa. Barcelona: Ariel, 2009. p. 241-267.
ROLNIK, Raquel. Democracia no fio da navalha: limites e possibilidades para a implementação de uma agenda de reforma urbana no Brasil. Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais, Belo Horizonte, v. 11, n. 2, p.31-50, nov. 2009. Associação Nacional de Pós - Graduação e Pesquisa em Planejamento Urbano e Regional (Anpur). Disponível em:https://rbeur.anpur.org.br/rbeur/article/view/219/203. Acesso em 30 jun 2021.