POLÍTICA HABITACIONAL E REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA PLENA NO MUNICÍPIO DE MARICÁ (RJ)

Autores

  • Lucas Ribeiro Botti IPPUR - UFRJ
  • Thatyane Alecrim Azeredo IPPUR - UFRJ

Palavras-chave:

Regularização Fundiária - Direito à Cidade - Moradia - Interesse Social, arranjo institucional

Resumo

RESUMO SIMPLES:

O presente artigo tem por objetivo apresentar um breve resumo da problemática habitacional e da política adotada pela administração pública local do município de Maricá, evidenciando os esforços do poder executivo em lidar com a situação e a intencionalidade de articular políticas públicas para garantir o direito à moradia, conforme dever constitucional. Ademais, mostra-se importante a ênfase na política habitacional em vigor de modo a discutir o desenho institucional no qual a mesma está inserida. Isto é, o estudo pretende abordar os arranjos de articulação e os modelos de contratação envolvidos que impactam na atuação pública e na promoção de uma regularização fundiária plena - que considere os aspectos jurídicos, urbanísticos, ambientais e sociais - contribuindo para o entendimento que a regularização fundiária deva garantir o direito à cidade para além da moradia (os espaços públicos; as condições de moradias; a economia urbana; o uso e a ocupação do solo; a gestão de riscos ambientais urbanos; o saneamento; a mobilidade; a assistência social; o sistema de saúde; a rede de educação; a energia e a segurança pública). Por último, pretende-se apontar, a partir dos dados levantados em pesquisa, caminhos possíveis para a administração pública viabilizar a regularização fundiária plena no município. 

 

RESUMO EXPANDIDO 

A cidade de Maricá está localizada na região metropolitana do Rio de Janeiro e é um território que vem passando por aceleradas transformações decorrentes do processo de urbanização nos últimos anos. Segundo Machado (2021), o avanço da economia moderna sobre o modo vida da roça - condicionado ao trabalho coletivo e a economia de subsistência - provocou transformações profundas no espaço e nas formas de sociabilidade na cidade. 

Nas últimas décadas, especialmente, houve um expressivo crescimento populacional que intensificou um padrão de desenvolvimento urbano excludente, com o adensamento de assentamentos que já eram ocupados por famílias ligadas ao trabalho rural ou pesqueiro. Segundo dados do IBGE, Maricá possuía em 2010 uma população de 127.461 habitantes, correspondente a 1,1% do contingente da Região Metropolitana, com taxa de urbanização de 88% da população. Em comparação com a década anterior, a população do município aumentou 66,1%, o 2º maior crescimento no estado. 

Segundo o Diagnóstico Técnico da Revisão do Plano Diretor de Maricá, cerca de 31,30% das moradias na cidade não possuem nem coleta e nem tratamento de esgoto e apenas 1,68% das moradias na cidade possuem situação de esgotamento regular, com coleta e tratamento. 

Dada à realidade do município e as dificuldades encontradas, a Prefeitura de Maricá, por meio da Secretaria de Habitação e Assentamentos Humanos (SHAH), tem elaborado uma série de políticas públicas articuladas em torno do programa Habitar, que tem como objetivo combater o déficit quantitativo e qualitativo habitacional da cidade, de modo que todas as suas frentes de atuação estariam interligadas. Atualmente, são seis frentes de atuação principais: 

  1. Regulariza Maricá (Reurb S) – É a fase de demarcação do assentamento, identificação das famílias e titulação dos beneficiários. Atualmente o município segue o marco da lei 13.465/2017 e utiliza a CDRU (Concessão de Direito Real de Uso) para as áreas públicas, de modo que o mesmo realiza obras necessárias de infraestrutura e urbanização dentro de um prazo estipulado, o que não impede a titulação;
  2. Melhorias Habitacionais – Realização de obras de reforma nas habitações que já passaram pela fase de titulação, o objetivo é lidar com o déficit qualitativo nas residências. É regulada pela lei municipal Lei nº 2.810 de 10 de setembro de 2018;
  3. Programa de Monitoramento, Controle e Desenvolvimento de Assentamentos Humanos (ou Pós Reurb) – Possui o intuito de verificar as condições de vida e os impactos causados pelo processo de regularização fundiária. Busca promover a segurança de posse para as famílias atendidas, com a emissão de certidão de habite-se para as casas adequadas, a consolidação dos assentamentos, com a delimitação de AEIS (Áreas de Especial Interesse Social) e a elaboração de parâmetros urbanísticos condizentes com as realidades construtivas locais. Na primeira versão do programa a SHAH optou por contratação de uma organização social por meio de licitação. 
  4. Locação Social – Benefício temporário para atender famílias em vulnerabilidade habitacional. A prefeitura reconhece a situação de risco e habilita os moradores à receberem auxílio aluguel em moeda social emitida no banco Mumbuca, um banco público municipal. Em situações de desastres, como a ocorrida devido às chuvas de 1º de abril de 2022.
  5. Reassentamento – O reassentamento é indicado quando a habitação se encontra em condição de risco ou insalubridade e não há meios de correção mediante o programa de melhorias habitacionais. A necessidade de reassentamento identificada em qualquer programa cria uma demanda habitacional que deve ser sanada pelo município. A SHAH também possui a alternativa de indenização da benfeitoria.  
  6. Formação do Parque Imobiliário Através de Credenciamento – A prefeitura realiza um credenciamento de imóveis residenciais passíveis de aquisição pela administração pública para compor um parque imobiliário municipal. Os proprietários que possuem imóveis ociosos podem credenciar seu imóvel. Após análise, os imóveis compõem a lista de unidades aptas à compra. 

Nessa perspectiva, depreende-se que a política habitacional do município considera a regularização fundiária como porta de entrada à população beneficiária, sendo a mesma, eixo central de atuação. Afinal, é na demarcação e na identificação dos beneficiários que as demandas sociais, urbanísticas ou ambientais podem ser verificadas. Observa-se um esforço da administração pública - especialmente nos programas de Reurb-S, Melhorias Habitacionais e Monitoramento - de compreender a regularização fundiária em seu aspecto pleno, para além da titulação.

Com efeito, o entendimento elucidado vai ao encontro do sistema teleológico de interpretação do ordenamento jurídico brasileiro, que estabelece a regularização fundiária dita plena como àquela que se apresenta sob diferentes facetas de modo a integrar a regularização dominial-registral, a urbanística e a socioambiental (CORREIA, 2017).

Segundo Granja e Magalhães (2021), a regularização fundiária plena também pode ser entendida como o conjunto de medidas jurídicas, urbanísticas, ambientais e sociais que visam à regularização de assentamentos informais. Portanto, as políticas de regularização fundiária que compreendem essas dimensões trabalham no sentido de contribuir para a mitigação da segregação socioterritorial e do acesso à terra urbanizada nas cidades brasileiras (GRANJA e MAGALHÃES, 2021, p. 4).

Dado panorama apresentado, a presente pesquisa busca identificar os efeitos da política habitacional na cidade, suas deficiências e potencialidades para, em seguida, constatar as condições de viabilidade de uma regularização fundiária plena que considere o direito à cidade em um aspecto amplo de melhores condições de vida e de acesso à cidade. 

Dessa forma, entende-se possível traçar as primeiras linhas de análise de uma política habitacional que se propôs a efetivar um programa de regularização fundiária plena em âmbito municipal. Assim, por meio dos dados obtidos junto aos documentos elaborados e disponibilizados pela prefeitura, o estudo pretende abordar os arranjos de articulação e os modelos de contratação envolvidos que impactam na atuação pública e refletir sobre a real possibilidade da efetiva implementação de uma regularização fundiária plena. 

BIBLIOGRAFIA

GRANJA, L. S. e MAGALHÃES, A. F. Condições de viabilidade para a regularização fundiária plena: uma problematização a partir da experiência de Juiz de Fora (MG). Revista brasileira de estudos urbanos e regionais, 2021.

 

IBGE, Cidades. Disponível em: https://cidades.ibge.gov.br/. 

 

CORREIA, Arícia Fernandes. Direito da regularização fundiária urbana e autonomia municipal: a conversão da medida provisória n. 759/2016 na lei federal n. 13.465/2017 e as titulações da Prefeitura da Cidade do Rio De Janeiro no primeiro quadrimestre de 2017. Revista Geo UERJ. nº 31. UERJ: Rio de Janeiro, 2017.

 

MACHADO, Ana. Do campo à periferia: as transformações do trabalho numa periferia metropolitana fluminense, Maricá - RJ. In: Seminário de História da Cidade e do Urbanismo (16.: 2021 : Salvador, BA). Anais do XVI SHCU. Salvador: UFBA, 2021. p. 2484-2500.

 

PREFEITURA MUNICIPAL DE MARICÁ (PMM) e INSTITUTO BRASILEIRO DE ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL (IBAM). Diagnóstico Técnico - CADERNO 2 - processo de revisão do Plano Diretor de Maricá/RJ. Outubro, 2020. p. 16-27. Disponível em: https://www.marica.rj.gov.br/2020/11/30/produto-3-diagnostico-tecnico/ 

 

PREFEITURA MUNICIPAL DE MARICÁ (PMM) e URBES - Instituto de Políticas Públicas Urbanas. Plano Local de Habitação de Interesse Social (PLHIS). Julho, 2010. Disponível em: https://www.marica.rj.gov.br/plhis/

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Publicado

2024-01-04

Edição

Seção

ST 9 - Direito social à moradia e regularização fundiária: perspectivas para políticas públicas habitacionais