A Sub-Representação Política das Mulheres Brasileiras no Legislativo Federal (2014-2022)

Autores

  • Gabriela Ortiz Abenel UFRGS
  • Jussara Prá UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL (UFRGS)

Resumo

Resumo Simples

O propósito neste artigo é analisar como as relações de gênero estão presentes e se manifestam em contextos eleitorais e no parlamento brasileiro. Tal recorte corresponde ao interesse de debater a questão das cotas e de outras medidas afirmativas, tendo em vista seus alcances e limites diante da ampliação do número de candidatas e eleitas. Fato observado nos pleitos de 2014, 2018 e 2022, aqui examinados. O estudo baseou-se em dados eleitorais e em revisão de literatura feminista sobre ações afirmativas, representação política e violência política de gênero. Esta vista como aquela violência vivenciada por candidatas e eleitas. A ideia defendida é a de que a difusão de ideias machistas e misóginas, ao lado da falta de recursos financeiros e materiais, dificultam a participação feminina na política. Somado a isso, a permanência de uma construção cultural que inibe o protagonismo político das mulheres realça o fenômeno da sub-representação feminina na política. Resultados preliminares indicam a importância do sistema de cotas e de outras ações afirmativas para a participação em processos eleitorais. O seu êxito, contudo, requer rígida fiscalização. Igual rigor deve garantir às mulheres o livre exercício de seus direitos políticos.

Palavras-chave: Mulheres, Sub-representação Política, Eleições e Violência Política de Gênero.

Resumo Expandido

A igualdade entre mulheres e homens avançou adequadamente em diferentes âmbitos da sociedade, a exemplo de áreas como educação, trabalho e política, ainda assim, ela tem sido insuficiente na maior parte do mundo. Em relação à política, como mostra a literatura apropriada, há um problema recorrente de sub-representação feminina em espaços de poder e decisão. Portanto, entende-se que para as mulheres ocuparem os espaços decisórios, como os homens historicamente o fizeram, é necessário cumprir determinadas condições, entre elas, o incentivo a medidas de apoio à igualdade de gênero e à participação feminina na política. A busca pelo direito ao voto e à elegibilidade foi uma dessas medidas. A conquista do sufrágio, porém, não garantiu a elas a presença equitativa em arenas decisórias; pelo contrário, desde então foi essencial manter em pauta as demandas pelo acesso pleno aos seus direitos políticos. Nesse patamar, a soma de mais e mais mulheres a essas lutas e sua adesão às causas feministas evidenciam a legitimidade e a potência destas reivindicações.

Coube às teóricas feministas dimensionar essa realidade e abordar o fenômeno da participação feminina em corpos executivos e legislativos. Em decorrência, puderam registrar que esta segue minoritária quando comparada à participação masculina. E não apenas isso, análises afins lograram detectar que as mulheres que decidem concorrer em eleições e atuar em instâncias de poder não raro ficam expostas à chamada violência política contra a mulher ou da violência política de gênero. Quer dizer, são alvo de diferentes tipos de agressões, incluídas ofensas verbais, silenciamentos, com a interrupção de suas falas, e até mesmo ataques físicos. Diagnósticos desse teor motivam novas estratégias institucionais, entre elas as das cotas de gênero e das leis de paridade; do acesso a verbas de campanha, à mídia e à formação política, ao lado delas criam-se leis para enfrentar a violência política de gênero. 

O termo violência de gênero é adotado no estudo para designar a sua produção em contextos nos quais as relações são produzidas socialmente. Assim, “o seu espaço de produção é social e o seu caráter é relacional” (ALMEIDA, 2007, p. 24). Com efeito, ela se sustenta em um quadro de iniquidades de gênero marcado por “desigualdades sociais estruturais” (ALMEIDA, 2007, p. 27). Nesse plano, as relações sociais, primordiais ao desenvolvimento da política, são um fator essencial para a convivência democrática. Entretanto, o contexto de machismo estrutural, enfrentado pelas parlamentares mulheres - diariamente podemos dizer - dificulta a sua participação política e a sua permanência nos espaços de poder. Em referência ao Brasil e a outros países da América Latina, Prá (2013) explica que embora a legislação tenha ampliado a representação das mulheres na política, elas permanecem sub-representadas, pois a adoção de medidas afirmativas, a exemplo das cotas, não incidiram sobre o machismo e o patriarcado. Isso reafirma a urgência da mobilização de grupos feministas em busca do reconhecimento de cidadania com o foco em políticas de paridade e para que sejam implementados mecanismos que protejam as mulheres que atuam na política. 

Diante do quadro esboçado, o presente artigo aborda dois temas relacionados: o da sub-representação política das mulheres e o da violência política de gênero. O objetivo do artigo é analisar como as relações de gênero estão presentes e se manifestam em contextos eleitorais e no parlamento brasileiro. Tal recorte corresponde ao interesse de debater a questão das cotas e de outras medidas afirmativas, tendo em vista seus alcances e limites diante da ampliação do número de candidatas e eleitas. Fato observado nos pleitos de 2014, 2018 e 2022, aqui examinados. O estudo baseou-se em dados eleitorais e em revisão de literatura feminista sobre ações afirmativas, representação política e violência política contra as mulheres. Esta violência vista como aquela vivenciada por candidatas e eleitas. A ideia defendida é a de que a difusão de ideias machistas e misóginas, ao lado da falta de recursos financeiros e materiais, dificultam a participação feminina na política. Somado a isso, entende-se que a permanência de uma construção cultural que inibe o protagonismo político das mulheres colabora para manter a sub-representação feminina na política. Por esse ângulo, estima-se contribuir com estudos interessados em refletir sobre o fenômeno da sub-representação política das mulheres brasileiras e sobre a violência política de gênero desencadeada contra elas e que constitui um fator a mais a dificultar seu ingresso   na vida política ou sua permanência nela.

Nos resultados do estudo, verifica-se que as políticas públicas endereçadas à adoção de ações afirmativas contribuem para o aumento da representatividade feminina na política, porém as mulheres são alvos de violência durante o processo eleitoral e, principalmente, quando eleitas. A violência política de gênero é constituída de duplo sentido, afinal representa uma violação aos direitos políticos da mulher e torna evidente a supremacia masculina na política. Em suma, os resultados indicam a importância do sistema de cotas e de outras ações afirmativas para ampliar a participação feminina em processos eleitorais. O seu êxito, contudo, requer rígida fiscalização. Igual rigor deve ser empregado para garantir às mulheres o livre exercício de seus direitos políticos e de suas funções públicas.

Referências Bibliográficas

ALMEIDA, Suely Souza de. Essa violência mal-dita. In: ALMEIDA, Suely Souza de (Org.). Violência de gênero e políticas públicas. Rio de Janeiro: UFRJ, 2007, p. 23-41

PRÁ, J. R. Cidadania de Gênero, Democracia Paritária e Inclusão Política das Mulheres. Gênero na Amazônia, v. 4, p. 15-35, 2013





Biografia do Autor

Jussara Prá, UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL (UFRGS)

Doutora em Ciência Política pela USP (1992), Mestre em Ciência Política pela UFRGS (1983) e Bacharel em Ciências Sociais pela PUCRS (1978). Professora Titular da UFRGS, atua na área de Ciência Política em metodologia de pesquisa, métodos quantitativos, políticas públicas, estudos feministas e de gênero. Exerceu a função de Coordenadora da Comissão de Pesquisa de Filosofia e Ciências Humanas / UFRGS. Participou do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher de Porto Alegre (COMDIM) e do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM), com mandato de conselheira na gestão 1999-2003. Integrou o Conselho Diretor da Rede Brasileira de Estudos e Pesquisas Feministas ? Redefem. Atualmente é líder do grupo de pesquisa no CNPq "Gênero, Feminismo, Cultura Política e Políticas Públicas". Coordena o Núcleo Interdisciplinar de Estudos sobre Mulher e Gênero (NIEM/UFRGS). Participa do Conselho Consultivo da ONG Coletivo Feminino Plural. É integrante do Observatório da Lei Maria da Penha e Consultora em Metodologias de Monitoramento. Consultora Ad Hoc do Programa Pró-Equidade de Gênero e Raça no mundo do trabalho da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres. Representa a UFRGS no Comitê de Gênero do Grupo Montevidéo - AUGM

Downloads

Publicado

2024-01-04

Edição

Seção

ST 4 - Gênero, Políticas Públicas e Divisão Sexual do Trabalho